O inimigo é outro

João Carlos é morador da periferia, 17 anos, filho de uma mãe solteira e tem mais 4 irmãos mais novos. Carla, sua mãe, tem que trabalhar 14 horas por dia para tentar dar o mínimo de criação para suas crianças, mas, por essa carga horária pesada, não tem muito tempo para ensinar bons valores para sua prole. Eles (seus filhos) sempre foram "largados" ao mundo, tendo responsabilidade apenas de ir às aulas pelo turno da manhã e o ócio contaminava-os seguidamente após as mesmas.
Carlinhos, como era mais conhecido, tinha que ser a segunda mão de obra na sua casa, era pedinte na Avenida Nazaré e tentava arranjar alguns bicos vezenquando, mas quase nunca haviam empregos para o seu grau de escolaridade. Normal. Apesar de suas preces à sua Santinha, nada mudou. E tudo que ele via ao redor de onde morava (na periferia), eram os seus amigos conseguindo sustento de suas próprias famílias através de pequenos furtos e tráfico de drogas. E, ele pensou: "Já que ninguém me ajuda, nem mesmo o Estado, por que eu tenho que me manter nessa miséria, vendo minha família passar necessidades ?". Foi aí, sem refutar muito, que começou a roubar.

Luís Felipe é um adolescente de 19 anos, filho único de uma Contadora e um Arquiteto. Nunca faltou nada para sua vida: amigos, comida, dinheiro, videogame e, até, saúde. Um menino de sorte. Rezava todo domingo na missa e agradecia todas as bençãos que sua 'Nazarezinha' já o proporcionou durante toda sua vida. Sobre as questões sociais, ele tinha uma visão muito comum em seu círculo social: "Bandidos têm que morrer, nunca aprendem. Ficam soltos e voltam a roubar!", e sempre dizia "Bem feito pra ele", quando via foto de algum ladrão morto nas páginas policiais do jornal da sua cidade.
Certo dia Luís Felipe estava no seu próprio carro, dirigindo para encontrar sua namorada, quando foi abordado subitamente por Carlinhos enquanto o sinal estava fechado, este último anunciava que isso se tratava de um assalto. Os olhos deles nunca haviam se cruzado até então. Duas vidas diferentes, dois caminhos absurdamente paralelos. Ambos demonstravam o medo de viver, com pupila dilatada, com as pernas trêmulas, aquele momento de tensão doía a qualquer um que via a situação. Taquicardia.

Nada aconteceu como Carlos havia planejado, pois Luís Felipe tentou arrancar com o carro e tudo que se ouvia, a partir de então, foram tiros. Luís morreu logo quando foi levado até o hospital, teve uma grande cerimônia fúnebre e uma enorme comoção social. Carlos foi a óbito minutos depois da tentativa de assalto, por tiros de policiais e sua família nunca teve dinheiro para enterrá-lo dignamente, ficando armazenado em algum lugar do IML.

Henrique, um cidadão da classe média que não tinha nada a ver com a história, dizia ao ler o jornal com a notícia de mais uma morte de bandido "Bem feito, tem que morrer mesmo esse tal de Carlos".

Texto de @poserdadepre

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